Hipótese de Mercados Eficientes

Resenha

Finanças
HME
Autor

Kléber Formiga Miranda

Data de Publicação

19 de julho de 2020

Ambientes de negócios devem ser caracterizados pela confiabilidade das informações prestadas e, essencialmente, deve permitir a todos os envolvidos na negociação o acesso as mesmas informações para sua utilização na tomada de decisão ótima. A informação prestada equanimemente proporciona uma precificação eficiente dos títulos negociados, qualificando o mercado. Esse contexto é abordado na hipótese de mercados eficiente (HME).

A discussão da HME se concentra no quão capaz é o mercado em absorver informações para a precificação de valores mobiliários. As informações advêm de períodos passados ou presentes, cujas percepções são incorporadas aos preços de títulos negociados. Sob o pressuposto da racionalidade, da utilidade e da capacidade de processamento dessas informações pelo ser humano, para a HME todos os agentes agiriam de forma similar no mercado.

De acordo com Fama (1970) um mercado é, pois, eficiente quando os preços refletem totalmente toda a informação disponível. Nessa pesquisa, Fama (1970) pressupõe o equilíbrio de mercado onde qualquer desvio seria ajustado pela ação dos demais agentes. Essa noção de equilíbrio indica ao investidor a possibilidade de ser remunerado de acordo com o risco aceito.

Esse pressuposto passou a ser questionado pelo fato de não haver possibilidade de ser testado empiricamente. Fama (1991) reconhece essa possibilidade, porém enaltece a importância da HME para modelagens e testes econométricos. Em sua nova abordagem, Fama (1991) propõe novos conceitos às proposições de mercados de forma fraca, semi-forte e forte para aperfeiçoamento de testes para cada conceito.

Da mesma forma, Malkiel (2003) reconhece não ser possível haver um mercado perfeitamente eficiente, pois dessa forma não haveria incentivo para agentes de mercado buscarem melhores desempenhos. Para Malkiel (2003), um mercado é eficiente quando não permite aos investidores obterem retornos anormais sem o consequente risco na mesma proporção.

A HME tratada por Fama (1970) corresponde à possibilidade de um grande número de investidores racionais, com foco na maximização do lucro, buscarem prevê o preço futuro de um título (ação, por exemplo). O acesso a informações capazes de gerar essa previsão daria ao investidor a garantia de retornos acima do mercado. A busca pelo melhor desempenho desencadeia uma competição entre os investidores, contudo para a HME os preços atuais já são reflexo das informações passadas e presentes ao considerar as expectativas quanto a valoração futura dos títulos. Assim, um mercado altamente eficiente seria aquele no qual o valor intrínseco de um título seria bem estimado pelo seu preço em qualquer momento.

Assim, o principal papel do mercado de capital, conforme Fama (1970), é disciplinar a alocação de recursos pelos investidores com base nos preços dos títulos. O valor positivo ou negativo do título indica ao investidor a alocação, ou não, de recursos no mercado, podendo trocar de alternativas na busca pelo melhor investimento (maximização do lucro).

Dessa forma, não seria possível para um investidor possuir retornos anormais sem haver anormalidade no risco assumido (Malkiel, 2003). Ao propor traçar um estudo teórico e empírico sobre a HME, Fama (1970) apresenta três formas de testes para pesquisas sobre HME, quais sejam a fraca, a semi-forte e a forte. Esses testes se dedicam a explicar as possibilidades de haver possibilidades de retornos anormais com base no tipo de mercado onde atua.

Em mercados onde se apresenta a forma fraca, os preços dos títulos são baseados, essencialmente, por dados históricos e, portanto, de fácil acesso a todos os investidores. Quando há informações disponibilizadas para o público em geral, tais como demonstrações contábeis, ocorre a forma semi-forte da HME. Baseado na premissa de todos investidores serem racionais e capazes de processar todas as informações disponíveis de forma a maximizar seus resultados, nessas duas formas não seria possível haver retornos anormais, dada a possibilidade de os investidores tomarem decisões ótimas com as mesmas informações.

A forma forte da HME é a mais criticada por propor um contexto no qual não há informações privilegiadas para nenhum investidor e, portanto, todas as informações disponíveis estão devidamente precificadas. Fama (1970) já alerta para o fato de não ter encontrado evidências contrárias às formas fraca e semi-forte, contudo esse resultado não foi o mesmo para a forma forte, indicando haver investidores ou grupo de investidores com acesso privilegiado de informações.

Outros testes foram realizados para avaliar o reflexo das informações no preço de títulos. O fair game pressupõe retornos anômalos iguais a zero, pois todas as informações passadas já estão incorporadas no preço das ações, não gerando diferença entre os investidores. Portanto o retorno estimado e o retorno médio não possuem informações sobre retornos futuros. No modelo fair game as condições de equilíbrio de mercado podem ser estabelecidas em termos de retornos previstos e aborda pouco sobre os detalhes da geração de retornos do processo estocástico. O processo Random Walk estabelece a falta de memória na precificação de títulos, pois seu preço atual reflete “totalmente a informação disponível”, portanto o preço futuro é altamente aleatório considerando a distribuição dos retornos passados não determinar a distribuição de retornos futuros. Num mercado Submartingale, segue a linha do Random Walk, contudo apresenta a imprevisibilidade dos retornos, impossibilitando a ocorrência de retornos anormais, pressupõe um retorno maior nos períodos posteriores.

A generalidade da forma forte da HME torna seus testes impraticáveis e sofre, portanto, críticas importantes, observadas em Fama (1991) quando propõe mudar o foco de cada teste da HME. A forma fraca se preocuparia com uma área ampla de teste de previsões de retorno, incluindo teste com dividendos, taxas de juros e sazonalidade (efeito janeiro). Para a forma semi-forte o autor propôs uma mudança no título para estudo de eventos e na forma forte mudança no título para teste de informação privada.

Desta forma, as pesquisas se concentrariam na previsibilidade de retornos com base em retornos passados e política de dividendos, na forma fraca. Na forma semi-forte os estudos se direcionariam para análise do impacto da publicação de informações ao mercado no preço dos títulos com base em estudo de eventos, para o qual seriam avaliadas alterações nos preços em períodos ex ante e ex post a determinado evento. E, por fim, na forma forte as pesquisas procurariam a compreensão, por meio de testes de informações privadas (ou privilegiadas), sobre o comportamento dos preços de títulos na presença de agentes com informações mais completas perante seus pares.

A dificuldade de testes da HME provocou algumas pesquisas empíricas no sentido de entender a precificação de ativos, dentre os quais Fama (1991) cita: a) O Modelo de Sharpe-Lintner-Black (SLB) para o qual carteiras não correlacionadas com o mercado oferecem retorno igual à taxa livre de risco; b) Merton (1973) e Ross (1976), complementando o modelo SLB, por meio da avaliação de múltiplos fatores na geração de retornos, além do fato de os retornos previstos limitar-se a sensibilidades; c) Os Modelos baseado em consumo (Rubinstein, 1976; Lucas, 1978; Breeden, 1979) onde os retornos esperados sobre os títulos seria função linear e positiva de seu consumo. O modelo multifatorial de Merton e Ross, segundo Fama (1991) é o sobressalente dentre todos.

Há uma indicação por Fama (1991) para a contribuição mais eficaz nos estudos de ventos, especialmente quando tratado em nível diário. Na forma forte, tratada em pesquisas sobre informações privadas, são indicados a análise da rentabilidade do insider trading, pois algumas pesquisas indicam a existência de informações privadas no mercado (value line, analistas de seguros, gestores de investimentos). Contudo o custo para o acesso a essas informações pode explicar o retorno anômalo para esses casos, denotando um mercado não tão eficiente, mas não foge da premissa da racionalidade dos investidores.

Malkiel (2003) avalia críticas à HME por meio de resultados estatísticos definindo eficiência quando retornos anormais são decorrentes de riscos anômalos. Para Malkiel (2003) existem evidências explícitas para a ineficiência do mercado. Cita alguns casos como a bolha da internet, em 2000, e outros casos como em 1987 quando o mercado perdeu um terço de seu valor sem indicações de mudanças no ambiente. O efeito janeiro também é abordado por ser um fato conhecido do mercado, mas recorrente. No caso do “efeito janeiro” os preços das ações tendem a crescer no início de janeiro de cada ano e se a HME fosse verdadeira, o mercado já teria ajustado essa informação no preço, impedindo sua recorrência, mas não é o caso.

A diferença explícita entre a HME e a proposição de Malkiel (2003) consiste na incorporação parcial ou total da informação na variação dos preços de títulos. Para a HME as variações de preços incorporam todas as informações a respeito das empresas, enquanto Malkiel (2003) propõe a possibilidade de haver ruídos no fluxo informacional, dificultando o reflexo da informação nos preços.

A HME define, portanto, um ambiente no qual os investidores alocam seus recursos de forme eficiente, assegurados pelo acesso e assimilação de toda informação disponível, contudo algumas anomalias de mercado foram identificadas colocando em descrédito a HME. Ações com grandes dividendos, por exemplo, apresentam melhor desempenho em períodos subsequentes. Para a HME quaisquer informações conhecidas seriam incorporadas ao preço, impossibilitando investidores a obterem retornos excessivos.

Fama (1970) já identifica fragilidade na HME em sua forma forte por ser genérica e de difícil exposição a testes. Os resultados empíricos contrários á HME sugerem haver relação entre previsão de analistas e o preço de títulos. Esse fato põe em dúvida a passeio aleatório proposto pela HME, no qual os preços futuros são frutos de informações futuras e não poderiam ser previstos.

Contudo, desconsiderar a HME não parece ser salutar para as pesquisas acadêmicas e para a compreensão do mercado. Suas premissas são consistentes, mas suscetíveis ao comportamento humano. Assim, a reação dos agentes às novidades disponibilizadas ao mercado desencadeará novos reflexos aos preços, cuja compreensão se faz necessária.

É importante observar a estimação de retornos diários com base em retornos diários e semanais, como disposto por Fama (1970), pois algumas pesquisas empíricas relatam esses achados como contrários à HME, enquanto os defensores da HME denominam essas relações como espúrias provocadas pela tendência dos analistas em expor apenas resultados de acordo com seus interesses.

Por fim, é possível concluir pela impossibilidade de existência de um mercado eficiente como proposto pela HME (o próprio Fama, reconhece essa proposição), sobretudo por haver informações não incorporadas aos preços, conforme Malkiel (2003), seja por informações privadas ou pela impossibilidade de todos os agentes assimilarem igual e racionalmente toda a informação disponível.


Fama, E. F. (1970). Efficient capital markets: a review of theory and empirical work. The Journal of Finance, 25(2), 383-417.

Fama, E. F. (1991). Efficient capital markets: II. The Journal of Finance, 46(5), 1575-1617.

Maikael, B. G. (2003). The efficiency market hypothesis and it critics. Journal of Economic Perspectives, 17(1), 59-82.


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